12.21.2005

A página da Mafalda

Recordações do Natal - IV
- O Dia de Natal
O Dia de Natal amanhecia comigo e a minha irmã a enfiarmo-nos na cama da minha mãe para as famosas guerras de cócegas.
Depois das filas para a casa-de-banho era estreada a roupa que a minha Avó Queta nos dava de "Menino Jesus", e lá íamos os quatro da vida airada para Lisboa ter com a parte paterna da família. Não éramos muitos... bom era quando a minha tia que vive no Funchal vinha com os meus três primos!
O Dia de Natal era também o dia de Aniversário do meu Avô João! O meu Avô João (Alentejano de gema), era o mais velho de sete irmãos. (Dizia-se antigamente que quando nasciam sete filhos todos homens, o mais novo era lobisomem. Pouco tempo depois do meu pai me contar esta história, lembro-me que o meu Tio Manuel (o mais novo) foi lá a casa. Eu era pequena mas ele já era velhote, e sei que quando o simpáctico senhor (era mesmo uma ternura) entrou lá em casa, com o cabelo todo branco no ar, eu tremi de medo e agarrei-me às pernas do meu pai a dizer que era o tio lobisomem....)
O meu Avô João tinha fama de ser forreta... fama não, ele era forreta, era do tempo em que não havia nada, logo o que havia tinha que ser bem dividido e bem gozado por cada um.
O meu Avô sentava-se à mesa e não se levantava enquanto houvesse comida. Já todos tínhamos almoçado e queríamos ir embora mas o meu Avô continuava sentado à mesa: "Filhos, se tá pago, comam!"O meu avô João foi a pessoa que mais feliz ficou por eu ter nascido a 31 de Dezembro, é que segundo ele, o meu pai ainda teve direito ao abono de família daquele ano. Ora se eu lhe desse o desprazer de nascer a 1 de Janeiro, o meu pai seria muito mais pobre como podem imaginar!Os almoços de Natal eram quase sempre em restaurantes. Nem me lembro se comíamos perú ou não... normalmente eu e a minha irmã éramos as únicas miúdas e passávamos o dia a implicar uma com a outra por estarmos tão aborrecidas.Ao fim do dia, lá voltávamos para os doces e petiscos da minha Avó Queta, e normalmente encerrávamos o dia com chá de príncipe e uma fatia de Bolo Rei.
MafTal

6 comentários:

Anónimo disse...

Diariamente aqui estou, a comentar ou não. Mas estou. E vejo. E leio. E saboreio estes momentos que o Moutal (Mourato) nos oferece.
Este texto complementa o interesse do blogue, em boa hora decidido pelo seu Autor.
Presumo que a Mafalfa seja sua filha - nem interessa saber -, mas nela está o génese da memória e da forma como a descreve. É encantador este pequeno texto: pelo que tem de familiar; pelo que tem de comum com a maioria de nós; pelo que nos faz reviver e até soltar uma lágrima de saudade.
Enfim, a memória da Mafalda é a memória que nós guardamos, algures no recôndito da nossa arca das recordações de infância, mas guardamos.
Um obgrigado sincero à Mafalda. E o desejo para que não seja este o único momento maravilhoso que nos proporciona.

MouTal disse...

Caro QR
é sempre bem vindo a esta casa.
A Mafalda já me prometeu que vai continuar a escrever a sua página.
Só não consigo convencer a minha outra filha, mas com o tempo talvez o consiga.
As suas palavras vão ser para ela um incentivo,e eu quero muito que ela escreva.

Anónimo disse...

Amigo MouTal
Não lhe perdoo se não continuar a incentivar a Mafalda, cujos escritos tenho acompanhado até este IV. Não me pronunciei logo, porque podia errar na primeira impressão ou ajuizar apressadamente. Mas, pensando, bem - impliquei comigo - quem sou eu para classifar este ou aquele trabalho? Ora - continuei no mesmo diálogo introspectivo - és um leitor, quiçá um apreciador de literatura, deves dizer alguma coisa, pois o valor, quando se apresenta, tem de ser reconhecido.
Para a Mafalda, o desejo de a ver trabalhar, pois nota-se que é - permita-me o termo - um "poço" de imaginação e sabe muito bem colocar as palavras. Tem uma escrita irrepreensível e não tardará, se não esmorecer, a figurar com dignidade nas Letras nacionais.
Escreve desafrontadamente, recorre aos factos que lhe estão na memória, envolve a acção com a dinâmica própria de quem já sabe exprimir a força da palavra e da acção.
Um grande desejo que isso aconteça, tão breve quanto possível, tão criativa como se apresenta, de tão desejada leitura como esta que nos prende.
Com sinceridade o digo.

Anónimo disse...

Uma delícia esta peça. A alusão a pormenores aqui retratados de uma forma tão simples e familiar como: “as filas para a casa de banho”, “o tio lobisomem”, “o avô forreta” ou “o direito ao abono de família”, são de uma qualidade só ao alcance dos predestinados. Obrigado à autora. Assino por baixo de tudo o que o “quadrúpe rosa” escreveu.

Anónimo disse...

Corrijo: Quadrúpede e não quadrúpe.

Anónimo disse...

Ó para mim a corar!!!!!!!

Quero agradecer muito estas palavras de incentivo.
Gosto muito de escrever, sempre gostei, mas sempre o fiz apenas para mim...
Mostrei algumas coisas a dois ou três amigos, mas eles têm um talento enormíssimo e sinto-me por vezes envergonhada perante eles... constato agora que nem lhes mencionei ainda este blog... o medo da sua crítica sempre me acompanhou...
Agora já não tenho quaisquer pretensões literárias, pelo que escrevo sem medos nem vergonhas...
Escrevo porque gosto, e se mais alguém gostar, fico muito feliz!

Passo os dias às voltas com números... Tento equilibrar-me com letras...